quarta-feira, dezembro 12, 2007

Destino

Sentou-se. As portas fecharam-se na partida, tal como todas as outras, em todos os diferentes portos.
Nela, apenas mais um abrigo, nada mais que excertos do caminho.
Levantou-se, um passo, depois outro e as lágrimas corriam provisórias num laço infinitesimal que a prendia neles.
O coração marcava-lhe o ritmo num compasso.
Mais um passo, e um novo porto.
O corpo revoltava-se com a indignação do cansaço.
Esperou, e cruzou os braços.
O cheiro acre da terra inundou-lhe os sentidos recordando-lhe de onde vinha.
O desenho das pegadas determinava a decisão.
No olhar já um novo porto longínquo onde demorar-se e também outro, rumo a casa.

quarta-feira, novembro 07, 2007

The Queen and the Soldier

The soldier came knocking upon the queen's door. He said, "I am not fighting for you any more"!The queen knew she'd seen his face someplace before, and slowly she let him inside.
He said, "I've watched your palace up here on the hill, and I've wondered who's the woman for whom we all kill. But I am leaving tomorrow and you can do what you will, only first i am asking you "why?"

Down in the long narrow hall he was led into her rooms with her tapestries red. And she never once took the crown from her head, she asked him there to sit down...
He said, "I see you now, and you are so very young, but i've seen more battles lost than I have battles won. And I've got this intuition, says it's all for your fun. And now will you tell me why?

The young queen, she fixed him with an arrogant eye. She said, "You won't understand, and you may as well not try". But her face was a child's, and he thought she would cry. But she closed herself up like a fan.
And she said, "I've swallowed a secret burning thread, it cuts me inside, and often I've bled". He laid his hand then on top of her head, and he bowed her down to the ground.

"Tell me how hungry are you? How weak you must feel....as you are living here alone, and you are never revealed. But I won't march again on your battlefield."And he took her to the window to see.
And the sun, it was gold, though the sky, it was gray, and she wanted more than she ever could say. But she knew how it frightened her, and she turned away, and would not look at his face again.

And he said, "I want to live as an honest man. To get all I deserve and to give all I can. And to love a young woman who I don't understand, your highness, your ways are very strange."
But the crown, it had fallen, and she thought she would break, and she stood there, ashamed of the way her heart ached. She took him to the doorstep and she asked him to wait, she would only be a moment inside...

Out in the distance her order was heard. And the soldier was killed, still waiting for her word. And while the queen went on strangeling in the solitude she preferred, the battle continued on...

***
Hoje as palavras traem-me...
Uma grande música de uma grande senhora!

segunda-feira, junho 18, 2007

O menino Sol

Ela teima em sentar-se à janela, estanque, inerte, indiferente à espera de agarrar os raios que lhe fogem pelos dedos. Não lhe ocorre nada, naquelas horas que passam vazias, a alma afugentada, varrida de vontade.
Tinha sido naquele sem esperar que lhe tombou do céu um raio, como um clarão. Olhou aquela centelha miúda que lhe acendia o ânimo e chamou-lhe Sol. Vinha do firmamento, transportava um novo raiar de espírito que lhe acendera a força que brotava da alma.
Há quem passe por aquela casa no meio da rua e a veja lá, tão demente como excessiva, na sua luta com o sol. Acolhera-o com a contemplação com que se admira o novo. Os cabelos loiros de claridade, iluminados de esplendor.
Há quem diga que desde que lhe caiu do colo e fugiu dos seus braços canta baixinho, para o ver voltar. Os olhos de mel enchiam-lhe o mundo num abraço terno. O cosmos cabia todo no seu riso, os lábios dois gomos frescos de aragem de vida. E é na lembrança dessas horas que o coração desfibrilha e ganha vida.
A ele, vê-o passar em muitos dos olhares que lhe surgem pelos trilhos da janela. Há neles aquela centelha de lume que ilumina e resplandece. E Ela, para não os esquecer, arruma-os de mansinho nas reminiscências daquele ser e sorri.
Um novo impulso toma-a pelas mãos e acompanha-a nas sendas a percorrer.
Não sei se foi a luz que a cegou quando tombou do céu como um clarão, não sei se foi na contemplação daqueles raios que se fez louca na sombra das manhãs.
Sei que ainda a oiço cantar, como quem chora, chamando pelos raios baixinho, para não os assustar.
É a memória a prolongar-se pelos ritos, a deixar-se ficar indolente no sopro de uma mente que ainda corre para agarrar os sonhos que lhe escapam borda fora…

terça-feira, maio 01, 2007

Saturno

Tu não foste tempo perdido no lento passar dos dias.
Foi ténue, o laço vago que nos unia no ir do tempo.
A oposição perfeita do que somos distancia-nos e separa-nos.
Em nós, apenas o abismo irreversível do conjunto das nossas diferenças.
Tu não foste o negro pó da lembrança em cada regresso das manhãs.
O menor resquício da tua presença em mim inocenta-se ligeiro nos raios que me aconchegam. Foi e seria na diferença intencional do círculo que formamos que o Universo se faria tacto e faro e vida em nós.
Mas o acto é apenas um rasto dos passos que demos, dos trechos que fomos.
Tu não és derrota ou rumo em mim. Neste jogo de sentidos não te dou a vitória nem espero um fim. Pode ser que um dia os desígnios se conciliem e me tragam outro ensejo. No doce conformar do Universo, foste…serás…és: horas, tempo, vago, destino… Danço nos teus anéis, alheia aos teus aferros…
No cruzar da tua órbita tens de gelo os teus cristais.
Nasceste Titã de foice com que mutilas e decepas; mas é na impermanência constante dos teus jeitos que és raiz: Céu e Terra nascem em ti…

quarta-feira, fevereiro 07, 2007

As minhas coisas

Eram coisas. Viviam ali, no sitio das coisas velhas, encavalitadas, umas segurando as outras.
Começaram poucas, pousadas em mão. Até que uma a uma, coisa a coisa, foram trepando até ao tecto em pirâmide. A mão já não as alcançava e saltavam ginastas sem trapézio atiradas para o topo. E pareciam tocar o céu quando arremessadas para o alto. Aí, nada lhes restava senão o sono de quem não dorme, onde permaneciam imóveis, o pó a beijar-lhes o corpo, a toca-las, cobrindo-lhes o abandono, sufocando-lhes a vida.
A menina subia ao sótão como refúgio e sentava-se no chão. Chamava cada coisa pelo nome, de cor. A sua mão pequena tentando alcançá-las de longe, em esforços. Os dedos da menina nunca chegavam a tocar-lhes, mas como truque do destino, a leve brisa que se levantava desses voos parecia acariciá-las e as coisas estremeciam.
As horas passaram ligeiras e a menina cresceu. Ainda chama por cada coisa, uma a uma pelo nome.
As coisas permanecem intocáveis, intactas, esquecidas. O pó apenas uma outra forma de tempo acumulado em camadas, trazido pelos dias. Às vezes passo-lhes os dedos e deixo-as respirar.

quinta-feira, fevereiro 01, 2007

Pela Lua

Onde estiveste? Ouvi a tua voz de criança perguntar-me do alto dos teus 5 anos, curiosa, ávida de tudo, com sede de saber.
Foste longe? Indagavas... o longe para ti apenas uma distância desconhecida entre o aqui e o distante.
Estás a ver, Inês? Foi ali que estive, até agora, quando me chamaste.
Na lua? O teu dedinho agitado apontava para aquela bola prateada cintilante no céu, os teus olhos verdes a crescer de perplexidade, inundados de desapontamento a espalhar-se na alma.
Para lá não quero ir, é escuro e não posso brincar. Disseste sorrateira. Os teus bracinhos pequenos, exploradores de histórias, viajantes de emoções, saltaram-me ao pescoço, cheios de ânsias e de esperanças. Para ti a lua, longínqua é difícil de alcançar e pode esperar.
É bom estares aqui agora... murmuraste antes de adormecer.
Peguei na tua mão, pequena, simples, curiosa, e sussurrei como se cantasse: espero que o teu mar apague da areia os passos que percorri na minha viagem pela lua, também a mim a lua já não seduz.

terça-feira, janeiro 16, 2007

Eterno

Amanheceu. O dia escorre em nevoeiro, desfaz-se em neblina num renascer constante, imutável que se espalha em átomos de milhões de sensações.
É um mundo a crescer, num novo dia, partículas que se agitam, ansiosas num novo olhar.
Não falo de mim, nem de ti, nem de ninguém, apenas do espaço, enorme, sideral, que se estende de nós à imensidão, respirando a cada pulsar de uma vontade.
Falo das estrelas, mapas de um céu distante nesse cosmos infinito, pedacinhos de luz morrendo em explosão.
E há a esperança, não minha, não tua, mas de alguém.
Algo pulsa distante nesse Universo infinito em que o nada existe.
Há um outro nível de vínculo, um pacto diferente que eterniza um fim.
Não sou, não és, não serei nem terás sido. No parecer continuo do tempo, há o circulo que criámos, onde nos reuniremos quando o mundo tiver horas.
E enquanto for noite no Universo onde moro e o escuro transbordar, galgando os dias, digo-te adeus e durmo em mim.

quinta-feira, janeiro 11, 2007

Viagens de uma Voz

Há um grito que se esconde em mim e que irreversivelmente me atira para o abismo.
Mas não sai, porque não tenho voz. Levaram-na ao nascer, arrancando-a para longe e para fora de mim.
E voou vagabunda, a minha voz, caminhando insolente pelos mundos a conhecer.
Por vezes enquanto caminhava muda e sem perceber, parecia-me senti-la a percorrer-me o corpo aos risinhos, matreira e a sussurrar.
A voz escondia-se, fechando o grito. E eu, sorria, devagar e com certeza.
Hei-de vencer-te, hás-de parar um dia! Eu tenho tempo e sei esperar.
E o grito, era apenas um sentimento, um sentimentozinho que crescia baixinho em mim. Não sentia, não o via e talvez nem o quisesse. Era tão frágil, que parecia ouvi-lo chorar, pequenino indefeso, nas profundezas do meu ser.
Tens-me amarrado, dizia, solta-me e deixa-me ir. E eu sorria e devagar (para que não se assustasse) pedia-lhe fica, só por hoje e acompanha-me nesta viagem.
Este mundo é imenso, contava-lhe, ao anoitecer, se foges não te encontro mais, não te quero perder.
E a voz, permanecia errante, pela brisa. Hei-de vencer-te, hás-de parar! Eu sei esperar.
E foi num desses dias que te vi, noutra direcção, eu olhei e entreguei-te o sorriso, a única posse que tinha como certa.
Como era possível, estares tão perto, e eu não te poder alcançar?
Estendo-te a mão, mas tu não vês e eu não tenho voz. Estás na outra margem e não me ouves, porque não sei gritar. Tanto te prendi, grito de mim, que já não sei onde estás.
E o grito enfureceu-se. Não era esse o combinado, ele havia de sair, quando o mundo fosse pequeno, eu ia soltá-lo e deixá-lo voar.
E o grito cresceu. Era pesado aquele grito que tinha escondido em mim e que me atirava para o abismo, irreversivelmente, com a revolta.
A voz viu-me de longe e parou! Entrou e levou-me o grito que saltava na garganta.
Hei-de vencer-te, hás-de parar! gritou-me quando saiu, eu pertenço ao Universo, às estrelas, nunca a ti!
E saiu vagabundo, o meu grito, caminhando insolente pelos mundos a conhecer.
A ti, ainda te vejo passeares-te pela outra margem do teu ser e continuo sem te alcançar.
O mundo é pequeno e talvez o meu grito te encontre, perdido e se esconda em ti.
Se o vires, não lhe peças nada. Diz-lhe apenas: que fique, que o mundo é pequeno para um grito imenso e que, só por hoje, se deixe ficar.
Em mim ficou a voz. E há quem jure que traz com ela a brisa e o cheiro a mar...
E sorrio ( não vou contar as viagens desta voz).
Essa voz que, só por hoje, ainda me foge, para esperar inteira, junto a ti.