segunda-feira, junho 18, 2007

O menino Sol

Ela teima em sentar-se à janela, estanque, inerte, indiferente à espera de agarrar os raios que lhe fogem pelos dedos. Não lhe ocorre nada, naquelas horas que passam vazias, a alma afugentada, varrida de vontade.
Tinha sido naquele sem esperar que lhe tombou do céu um raio, como um clarão. Olhou aquela centelha miúda que lhe acendia o ânimo e chamou-lhe Sol. Vinha do firmamento, transportava um novo raiar de espírito que lhe acendera a força que brotava da alma.
Há quem passe por aquela casa no meio da rua e a veja lá, tão demente como excessiva, na sua luta com o sol. Acolhera-o com a contemplação com que se admira o novo. Os cabelos loiros de claridade, iluminados de esplendor.
Há quem diga que desde que lhe caiu do colo e fugiu dos seus braços canta baixinho, para o ver voltar. Os olhos de mel enchiam-lhe o mundo num abraço terno. O cosmos cabia todo no seu riso, os lábios dois gomos frescos de aragem de vida. E é na lembrança dessas horas que o coração desfibrilha e ganha vida.
A ele, vê-o passar em muitos dos olhares que lhe surgem pelos trilhos da janela. Há neles aquela centelha de lume que ilumina e resplandece. E Ela, para não os esquecer, arruma-os de mansinho nas reminiscências daquele ser e sorri.
Um novo impulso toma-a pelas mãos e acompanha-a nas sendas a percorrer.
Não sei se foi a luz que a cegou quando tombou do céu como um clarão, não sei se foi na contemplação daqueles raios que se fez louca na sombra das manhãs.
Sei que ainda a oiço cantar, como quem chora, chamando pelos raios baixinho, para não os assustar.
É a memória a prolongar-se pelos ritos, a deixar-se ficar indolente no sopro de uma mente que ainda corre para agarrar os sonhos que lhe escapam borda fora…